Na conta de luz, o Fisco vem tributando, além da energia efetivamente consumida pelos contribuintes, as Tarifas sobre distribuição e transmissão de energia (TUSD e TUST) sobre o ICMS. A legalidade desta cobrança está sendo questionada no IRDR - Tema n°956, do Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, muitos contribuintes continuam ajuizando demandas visando à restituição dos valores pagos a título de ICMS/TUSD e TUST, cobrado nas faturas de energia elétrica dos últimos cinco anos.
Primeiramente, importante destacar que o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), de competência tributária dos Estados e do Distrito Federal, incide, entre outros fatos geradores, nas operações de circulação de mercadorias, nos termos da primeira parte do inciso II, do art. 155, da Constituição Federal. Sendo que, se consideram mercadorias os bens móveis com destinação comercial, postos em circulação com habitualidade e em volume que caracterize intuito comercial[1].
Nesta perspectiva, a energia elétrica é considerada mercadoria e sua comercialização é tributada pelo ICMS. Observe, então, que essa cobrança de ICMS sobre a Tarifa de Energia (TE), sobre a energia efetivamente consumida é devida, é legítima e encontra respaldo constitucional.
A controvérsia existente é quanto à cobrança de ICMS sobre a Tarifa de Uso do Sistema Elétrico de Transmissão de Energia Elétrica (TUST) e sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD). Isso porque tais tarifas cobram pelos serviços de transmissão e distribuição de energia elétrica, que contemplam equipamentos, instalações até a chegada da energia elétrica à residência ou ao estabelecimento do consumidor final, que são serviços realizados anteriormente ao consumo da energia pelo usuário.
Nesse contexto, significativa parte da doutrina e da juriprudência defendem a ilegalidade da tributação de ICMS sobre as tarifas TUST e TUSD na conta de luz, uma vez que, como o fato gerador do tributo é a saída da mercadoria – ou seja, o consumo efetivo pelo usuário da energia – o consumidor tem o direito de pagar o referido imposto sobre a energia que, de fato, consumiu, não podendo assumir responsabilidade que é da concessionária de energia pelos serviços de transmissão e distribuição. É o que consta do enunciado de súmula n° 391 do Superior Tribunal de Justiça: “O ICMS incide sobre o valor da tarifa de energia elétrica correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada”. E é o que defendem os tribunais (TJ/DF e TJ/SP):
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. ENERGIA ELÉTRICA. TUST E TUSD. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO. CABIMENTO. PRECEDENTES. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. A TUST e a TUSD não integram a base de cálculo do ICMS, que deverá incidir tão somente sobre o valor pago pela energia consumida. Precedentes do STJ e do TJDFT. 2. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-DF 07082407220178070000 DF 0708240-72.2017.8.07.0000, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 27/09/2017, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 04/10/2017).
AGRAVO DE INSTRUMENTO – TRIBUTÁRIO - AÇÃO DECLARATÓRIA C.C REPETIÇÃO DE INDÉBITO – ICMS – ENERGIA ELÉTRICA - "TUST" E "TUSD" - TUTELA ANTECIPADA – Decisão que deferiu a tutela antecipada para afastar a incidência do ICMS sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) – Exação que vem sendo rechaçada pelos tribunais com apoio na Súmula 166 do STJ – Entendimento jurisprudencial no sentido de ser indevida a cobrança – Desnecessidade de submeter o contribuinte à odiosa via do "solve et repete" – Precedentes jurisprudenciais deste Tribunal de Justiça – Decisão agravada mantida – Recurso não provido. (TJ-SP - AI: 21849038320168260000 SP 2184903-83.2016.8.26.0000, Relator: Ponte Neto, Data de Julgamento: 19/10/2016, 8ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 19/10/2016).
No entanto, existe posição em sentido contrário[2], que argumenta não ser possível dissociar as fases do fornecimento de energia: distribuição, transmissão, geração até o efetivo consumo pelo usuário final, que admitiram a inclusão das tarifas TUST e TUSD na base de cálculo do ICMS.
Diante dessa controvérsia e do panorama de prolação de decisões com fundamentações opostas acerca da mesma matéria, instaurou-se o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR (art. 976 e ss, CPC/2015), Tema n°986/STF, para analisar a temática e proferir uma posição nacional e unificada, cessando o conflito e garantindo maior segurança jurídica aos contribuintes.
O IRDR instaurado teve como consequência a suspensão dos processos que tratam deste tema, pois eles ficarão aguardando a decisão a ser proferida no IRDR, que lhes será aplicada.
Contudo, mesmo após a instauração do IRDR, existem contribuintes ajuizando demandas com o objetivo de requerer a restituição dos valores pagos à título de TUST e TUSD na conta de luz, pelos últimos cinco anos.
Isso porque, na prática, há tribunais que suspendem apenas os processos que estão em fase de recurso, permitindo aos processos novos toda a tramitação em primeira instância, mesmo com o RDR instaurado.
Diante deste cenário de incerteza, cabe ao contribuinte, que se sentir lesado e interessado em reaver a restituição dos valores pagos de TUST/TUSD sobre o ICMS na conta de luz, buscar orientação de advogado especializado para escolher a conduta mais favorável a ser adotada diante das circunstâncias fáticas específicas.
[1] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 12. ed. Salvador: Juspodivm, 2018. p.745.
[2] Vide: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTOS. ICMS. ENERGIA ELÉTRICA. TUST. TUSD. BASE DE CÁLCULO. CONSUMIDOR CATIVO. A base de cálculo do ICMS, no mercado cativo, será o preço final da operação, o qual se compõe pelo preço da distribuição, da transmissão e da produção da energia; portanto, regular a inclusão das denominadas TUST Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão e TUSD Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição na base de cálculo do ICMS. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70077434660, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Newton Luís Medeiros Fabrício, Julgado em 13/07/2018). (TJ-RS - AC: 70077434660 RS, Relator: Newton Luís Medeiros Fabrício, Data de Julgamento: 13/07/2018, Primeira Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 06/08/2018).